FUTURO DO PRETÉRITO

Eu queria ser capaz de dizer tudo:

O que sinto, as minhas decepções, meus medos;

Descrever os sonhos que vejo desmoronar

E mostrar quão trincado está

O frágil cristal da minha esperança.

Eu queria ter o dom

De te fazer entrar em mim

Para não precisar dizer nada mais,

Apenas deixá-lo sentir as feridas que encubro

Com esparadrapos de sorrisos.

Eu gostaria de fazer-me transparente

E te mostrar que me afogo nas lágrimas que acumulei,

Pois nada vale chorar escondido...

Lágrimas são gritos, são frases,

São declarações, são pedidos de socorro

E só servem se alguém as vir e secar.

Eu desejaria ter um amanhã,

Mas escrevo usando verbos conjugados

No futuro do pretérito

Porque sei que minha história não depende só de mim,

E não há em ti a vontade de me ajudar a escrevê-la.

Eu não sei mais se há algum sentido,

Mas sei que houve um dia.

O ontem que vivemos parece, no entanto,

Ter sido em outra existência.

Se eu falasse não faria diferença.

Se eu calasse também não faria.

O que farei da novela sem audiência

Que se transformou a minha vida?