Crianças de Hiroshima
Olhos se voltam pro céu,
Mãos sujas, juntas revelam uma espécie de oração.
Lábios aflitos sorvendo as palavras poucas
Que mais pareciam ser um pedaço de pão.
Ainda esborçam sorrisos mil...
Correndo pelas ruas, brincam e não vêem mais as horas.
Se estende então, o manto negro celeste, e seu total plenilúnio.
Está na hora de mamãe contar-lhes uma história.
E a longa noite começa já do sono plácido das crianças.
A mãe, com o rosto mais plúmbeo que o inverno,
Olha para o céu estrelado
Pensando em quando acabaria aquele inferno.
"Durmam, crianças incautas,
Durmam com a incerteza de viver.
Eis que no albor de seus olhos incertos
Fome e miséria, extremo sofrer.
Sonhem com novos ideais,
Vivam no amanhecer,
Peçam pra Deus que mande
Algo bom pra gente comer.
E que ele veja nos seus olhos
A inocência transvestida de alvorecer,
E saiba que estamos chorando
Pelo nosso próprio modo de viver."
E vai virando mais uma noite de penumbra,
Parecendo nunca chegar a um fim.
Preces e orações jamais voltam,
E seguiam as noites sempre assim...
Eis que em uma manhã, sem esperar,
As crianças viram uns homens fardados.
Com armas nas mãos, ao invés de pão,
Eram monstruosos soldados.
Ensurdecedor barulho começa.
E as crianças, lançando seus joelhos ao chão,
Olham fixamente para o céu aberto.
Incessantemente declamam a Deus sua triste oração.
Eis que do céu, desce algo indescritível...
Algo que trazia consigo a própria destruição.
De santo não tinha absolutamente nada,
Muito menos possuía traços de pão.
E o fragmento "celeste" osculou o chão,
Lambendo com língua esfaceladora tudo que ali estava.
Carbonizou com seu bafo devastador
Os restos mortais do que chamavam de pátria.
"Durmam em paz, crianças sofridas,
Em algum lugar lá em cima.
Levadas pela bomba atômica foram,
Nossas crianças de Hiroshima."
(Jefferson Rodrigo)