Hoje não... mais!
Hoje eu não quero sorrir
Não agüentaria ver-te partir
Escondo minha face sob as sombras dos azuis
Na tela onde a dor cromatiza o último beijo
Crio perfumes com o veneno do teu descaso
Não ouse esboçar mais mentiras ao acaso
Teço um precipício com as tuas desconfianças
Pois feriu de morte meu amor sem esperanças
Encubro de véus minha alma embotada pela mágoa
Desabando em encostas encharcadas de chuva
Componho vazios com os meus desejos silenciados
Grito mudo sem absorver tuas palavras
Despejo vulcões sobre as tuas prepotências
Não deste trato às minhas carências
Hoje eu não quero sentir...
Dores com que queres me aferir
Não quero nem mesmo escorrer as decepções
Resguardo-me do teu oceano de ilusões
Que ainda estão em minhas mãos, em meus fluídos
Contaminada que fui por teus ardis
Hoje eu não quero sorrir...
Tampouco chorar...
Fecho os olhos para a luz que devassa as frestas
Hermeticamente fechada, aparando arestas
Recolho as minhas tempestades à incômoda crisálida
Sou borboleta sem asas cortadas por ti
Hoje eu não quero existir...
Entrego-me à inércia dos dias que virão
Risco as rimas de todos os orgasmos
Entranhas reviradas em espasmos
Apago os meus poemas da tua memória
Nas entrelinhas perdeu-se a nossa história
Rasuro as minhas entregas
Que em teu ego esfregas
Amasso as vontades...
Que em ti ainda navegam
Descanso meus dedos
No fundo dos teus segredos
Dispenso os sentidos
Desejo sossego...
Seco os lábios...
Ainda umedecidos
Hoje não atendo os pedidos
Suspiro sofrido.
Não escrevo poemas
Nem bilhetes encardidos
Anestesio o coração
Desligo a alma.
Dueto: Silvia Mendonça e Hildebrando Menezes