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O espelho retrata o que vivi,

nesse rosto que quase não reconheci.

O que conterá aquela ruga ali?

O que padeci,

justifica essa outra aqui?

Que idade terei

nesse corpo que nem sei?

Todos esses vergões

foram só os senões?

Que estrada andei,

que grito sufoquei

e que murro que não dei?

A lâmina corta a barba,

pois a cerimônia não tarda.

E preciso me aprontar

para o Tempo me levar.

De meu, nada levarei.

Tampouco deixarei.

Talvez sintam minha falta,

mas então já será noite alta.

Do escuro breu sem Luar,

ouvirei, talvez, uma voz rezar.

E apurarei o ouvido a escutar

enquanto pressinto uma lágrima rolar.

Pois cá ficará

quem eu pude amar.

Talvez guardem-me o lugar

na antiga mesa do jantar.

Ali, onde um dia, chamei de lar...