A Lenda da Anta do Sono
Fui a um sítio outro dia
e no campo tive de pernoitar;
eis que noite alta ouvi melodia
como de um anjo a cantar.
Havia uma anta bem ao lado
e sobre ela à luz da lua
linda moura penteava com cuidado
a longa e negra cabeleira sua.
- Quem sois, donzela que canta?
perguntei à tão bela aparição.
- Sou a moura que vigia esta anta,
- respondeu-me ela em aflição.
- Um cruel mouro aqui m'aprisionou
e vivo desde sempre encantada.
Nas noites de lua aqui estou,
a cantar para que seja libertada.
Mas não guardo aqui jóias e ouro
e isto afasta os pretendentes.
Sou eu mesma meu único tesouro
e isso não interessa aos viventes.
- Engana-te, núbil moura formosa,
tesouro maior não se poderia sonhar
do que os teus lábios de rosa
do que a tua beleza sem par.
Quebrarei de pronto o encantamento
e tomarei lesto a tua mão;
juro pela luz desse firmamento,
guardarás somente o meu coração!
Desceu então da anta a donzela
ainda penteando os longos cabelos
e não havia ninguém mais bela
que merecesse todos meus desvelos.
Mas antes que eu a beijasse
ouviu-se um galo a cantar
e sem que nada falasse
a moura desapareceu em pleno ar!
Eu lá tenho voltado,
ano após ano em vão.
Agora sou eu o encantado:
a moura prendeu meu coração.
(08-09-2009)