A ESMOLA
Magras
como as bisagras
de algum caixão funerário
que fecha o corpo à criança,
foi desse modo que as vi.
A filha, desidratada,
de pele aos ossos colada,
o mole seio materno
nem mais podia sugar.
Na cor roxo-amarelada
muito mais que desbotada,
parece, não tinha sangue.
Os olhos, dois pirilampos
piscando, pedindo vida,
numa expressão comovida
pronunciavam...
- Suponho tê-los ouvido
em seu silêncio de morte -
pronunciavam - mamãe...
Era a mãe, silenciosa,
tristonha, quieta, chorosa,
quase sem forças - raquítica
sobre uma esteira deitada.
Olhou-me, estendeu a mão
na qual eu pus um tostão
que de nada me servia.
Um jarro frágil, vazado
em vidro cristalizado,
desse modo as comparei.
Passava para o almoço...
Passava - quando voltei...
Eram as duas inermes,
como se fossem dois vermes
dormindo um sobre o outro...
Comparo duas bisagras,
um jarro fino e uma flor,
unicamente dois vermes...
Dois vermes pedindo amor!
Mas eu lhes dei a esmola...
- Desgraça! A última esmola! -,
que nem sequer foi servida.
Comparo agora essa vida...
Não acho comparação.
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