ANOITECER
Anoitecer?
Ahh, eu já anoiteci há tantas décadas
quantos foram os outonos que recebi sem querer...
E quando olho teus espelhos entupidos de arrogância,
sinto ímpetos de fazer neles refletir a valsa
do crepúsculo demente que ora vivo.
Claro que eu não quero te fazer cativo... Podes ir.
Não! Não se preocupe que eu não vou roubar
tuas primaveras, nem alienar tuas quimeras
tão bem dançadas ao ritmo da salsa.
Porém, não repara se eu ficar aqui de longe,
tamborilando meus dedos gelados, não de monge,
mas, de devassa... Na cadência de um velho tango.
Pois, eu já não posso ver meu próprio reflexo
porque os meus espelhos se quebraram
no congestionamento de tuas máscaras
e em cada amplexo que elas demitiram.
Anoitecer?
Sim, eu anoiteci com cada gota desperdiçada
(que fez meu espaço terreno escurecer...)
nessa chuva derramada que o teu espelho jamais vai refletir
por estar ocupado demais com a tua gargalhada...
Anoitecer?
Sim, é preciso...
Pra que possa haver um novo amanhecer
sem dor, sem hipocrisia e sem mágoas...