PERDI, PERDIDA

Todos os humanos, absolutamente todos

Dormem um sono hipnótico e abismal

e somente eu carrego a maldição

de estar acordado perambulando sorumbático

Logo eu que nem sei se sou humano

Suporto o peso de estar desperto.

Por que eu não dormi como todos os outros?

O que eu fazia? Eu procurava

E nada, nada eu encontrava...

Aves noturnas berram

suplicam deprimidas minha atenção,

querem contar-me de suas tragédias,

de seus dramas cosmogônicos que ninguém escuta..

Eu vocifero a elas: eu sou igual a vocês

quantas palavras eu disse e ninguém me escutou,

"Suspirei as canções mais doloridas e ninguém me escutou" disse Álvares de Azevedo

Pobres aves noturnas!

Eu sonhei com a vida que deslizava austera

e digna nas sangas que quando ainda guri

eu bebia exultante.

Lembro-me do sol sorrindo

nas magnificências do orvalho de uma manhã inigualável.

Eu sonhei... Ah! eu era livre para amar...

para o amor... e agora? Eu sou um desgraçado.

E sigo sem encontrar o que tanto eu queria...

Eu já não mais agüento esses esqueletos

agarrados nos meus tornozelos,

invocando a minha clemência para que eu os chute

enfurecido naquele leito estéril de rio

Mas já não tenho forças para chutar

e pergunto a eles se encontraram o que eu procurava,

mas os dentes despencando da boca flácida

respondem-me que não, que não, que não...

Caí sem ter encontrado o que tanto almejei

Gritei com todas as potestades celestes e infernais,

em seus palácios, que também não tinha encontrado

o que tanto procurei na noite infinda...

O que eu procurava? A esperança na humanidade.

Perdi para sempre, perdida para sempre.

**Inspirado no Conto Alucinado de Alessandro Reiffer