Você

Você abre a porta do seu quarto e joga a sua jaqueta favorita em uma cadeira. Ela ascende à luz, e diz que gostou muito do estilo da sua casa, pelo menos da parte que ela viu. Você tira a sua corrente de prata e a coloca delicadamente na mesa. Ela fala e fala e fala. Você se olha no espelho sem saber o que fazer, e pela primeira vez na noite, ouve alguma coisa. Uma música. A nossa música. Ela estava dizendo o quanto gosta desta canção enquanto olhava a sua coleção de cd. Você tira a sua camisa branca banhada no perfume que nós escolhemos juntos e na colônia vagabunda dela. Ela se excita e desce o zíper do vestido carmim, expondo a lingerie negra. Você se aproxima e solta os longos cabelos negros dela, e se lembra dos meus. Ela admira seus músculos e arranha seu peito. Você solta o sutiã e ela pressiona os seios firmes em você. Ela desafivela o seu cinto e você aperta os quadris dela. Você termina de tirar a calça e ela se livra dos sapatos. E pela primeira vez desde que começaram este ritual, você olha nos olhos azuis dela. E neles, você não se vê como você se via nos meus olhos castanhos. Ela sorri maliciosamente aprovando o que ela vê, e avança. Vocês se enroscam na cama que eu trouxe para sua casa quando me mudei. Você entra na boca dela com sua língua, e ela aperta a sua nuca com força e desejo. Mas sou eu quem você beija. É o meu sabor que você sente. Ela se desgruda de você, e os beijos dela descem pelos seus pêlos do peito e abdômen. Mas no espelho em frente a sua cama, quem está entre suas pernas sou eu. Você a joga de costas e a penetra com vigor. Ela geme e grita e arfa. Mas o hálito no seu pescoço é o meu. O sabor do suor na sua boca é o meu. O corpo tremendo de prazer sobre o seu é o meu. Ela goza até desfalecer, mas você não sente nenhum prazer ou alívio. Enquanto ela dorme coberta pelos lençóis que eu dei no seu aniversário, o volume um pouco mais alto da nossa música encobre os sons que você faz enquanto vomita no banheiro. Você está com nojo de si próprio. Cada poro da sua pele que eu tanto admirei exala um odor que você repugna. Você tenta se limpar no chuveiro, mas sabe que não importa quanta água corra pelos seus pêlos, nem quantas lágrimas lambam seu rosto envelhecido pela tristeza, você está marcado para sempre pela minha presença. Você sabe que me perdeu, e que foi escolha sua. E por isso o ódio que você sente é maior ainda, pela sua covardia e estupidez. Você se seca na nossa toalha, mas sabe que o meu cheiro não está mais lá. Você pega o nosso perfume, só para perceber que ele acabou. No quarto, você pára o rádio. Nunca mais vai ouvir a música que eu escolhi para nós com tanto carinho. Você sobe nu na cama e descobre o corpo dormente dela. Ela acorda com você a invadindo por trás e a puxando pelos cabelos. Ela está feliz por ter encontrado um amante tão fogoso. Você não sente absolutamente nada. Está morto por dentro, apodrecendo a cada metida. Apenas desempenhando o papel que designou para si próprio. Para sempre acompanhado pelas lembranças da época em que você foi meu e eu fui seu.

Sailor Paulino
Enviado por Sailor Paulino em 16/03/2009
Reeditado em 16/03/2009
Código do texto: T1488728
Copyright © 2009. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.