Trem de Ferro
Trapatum,
trapatá.
Trapatum,
trapatá.
Vai o trem chorando,
vai indo na mata;
lá vão balançando
vagões já sem data.
Manteiga, café
e pão de primeira
não tem pois não é
o Trem do Bandeira.
Desfaz e faz volta,
gemendo a valer,
e o fogo ele solta
no seu padecer.
Por onde ele passa,
sem mapa, sem guia,
soltando fumaça,
vê sua agonia.
E segue gemendo,
contando um a um
os ossos doendo
no seu trapatum.
II
Trapatum,
trapatá.
Trapatum,
trapatá.
Já vai bem cansado,
não pode aguentar,
nem sabe o coitado
que tem que voltar.
E chora e assovia,
faz força no chão,
que lenha, água fria,
quer muita pressão.
Vem rampa chegando...
mas vê, quem diria!
declive chegando,
prá sua alegria.
Que é isto? Correndo
e não quer parar!
Não sei se estou vendo,
se estou a sonhar...
No entanto, arfando
com velhos, meninos,
prossegue levando
diversos destinos.
III
Trapatum,
trapatá.
Trapatum,
trapatá.
Mas pobre do trem!...
no seu mourejar
não sabe o que tem
em si a levar.
No seu intestino,
em quadros abertos,
vão tantos meninos,
dormindo e despertos,
que o grande na idade,
que chora e odeia,
sentindo saudade,
levanta e vagueia.
E cada criatura
de olhar insolente,
que pensa em altura,
não sabe ser gente.
Coitado do trem!...
sem forças, cansado,
gastando o que tem
puxando pecado!
IV
Trapatum,
trapatá.
Trapatum,
trapatá.
Com tanta canseira
na estrada deserta,
não sabe a "Brejeira"
que leva um poeta.
Um pobre tristonho
que canta em sua lira
a vida dos sonhos,
sem ódio, sem ira.
Que escreve o que somos,
por onde passamos,
aquilo que fomos
e o que deixamos.
Que cada versinho
escrito com amor
tem alma, carinho,
perfume da flor.
Poeta que chora
e segue sozinho
sem riso, sem hora,
em busca de um ninho.
V
Trapatum,
trapatá.
Trapatum,
trapatá.
Mas o trem cansou,
num chiado morreu,
o poeta calou,
ouviu e desceu.
Mas pobre coitado!
Vem fogo, vem água...
enfim, dominado,
se arrasta com mágoa.
Um chiado, um suspiro
prá quem o maltrata,
sem volta, sem giro,
penetra na mata.
É dia sem cantos,
no meio à procela
vão tantos em prantos
em cada janela,
que o trem a chorar
fez força e partiu,
com fogo a queimar,
na curva sumiu.
VI
Trapatum,
trapatá.
Trapatum,
trapatá.
Adeus, trem de ferro,
meu trem quase humano,
que apita num berro
só de desengano,
buscando esperanças,
quer queira ou não queira,
levando lembranças
ao Trem do Bandeira!