O ESPELHO E O CORAÇÃO
Conclamo o público-alvo de minha decadência, a que me assista nessa hora;
Venham sem demora, com palmas sarcásticas pra me ovacionar;
E eu vou me curvar, prestando reverência ao mundo que me devora;
Assim vou à desforra, com esse meu modo fracassado de triunfar!
Tomem de assalto meus castelos, reles apóstolos da empáfia;
Pois eu pertenço à máfia dos dias que estrelam sol noturno;
Me gabo de meu garbo mudo, pra me proteger dessa abjeta falácia;
Eu sou a própria audácia, tremendo de dor por trás de seu escudo!
Dançando ao som ferino do trôpego e sofista violino;
Um único mimo inunda meu âmago de hematomas;
Medalha de ouro para os meus sintomas, vaias para o destino;
E do que me sobrar a esse refino, favor subtrair de minhas somas!
Para expulsar de uma vez meu indigesto eu dessa grei;
Onde só aprendo o que não sei e me sinto esquecido em pleno leilão;
Um destronado leão, sem direito aos deveres da justa lei;
Um cansado ex-rei, apegado ao seu cetro-plebeu de solidão!
Palmas para mim, sou ou não sou a piada da hora em questão?
Nada de lealdade ou traição, só me dão esse vão de descaso confuso;
Sinto-me um mal vindo intruso, nessa verdade que é pura alucinação;
Esqueçam de vez meu coração - por ninguém lhe querer, ele já nem uso!