O ESPELHO E O CORAÇÃO

Conclamo o público-alvo de minha decadência, a que me assista nessa hora;

Venham sem demora, com palmas sarcásticas pra me ovacionar;

E eu vou me curvar, prestando reverência ao mundo que me devora;

Assim vou à desforra, com esse meu modo fracassado de triunfar!

Tomem de assalto meus castelos, reles apóstolos da empáfia;

Pois eu pertenço à máfia dos dias que estrelam sol noturno;

Me gabo de meu garbo mudo, pra me proteger dessa abjeta falácia;

Eu sou a própria audácia, tremendo de dor por trás de seu escudo!

Dançando ao som ferino do trôpego e sofista violino;

Um único mimo inunda meu âmago de hematomas;

Medalha de ouro para os meus sintomas, vaias para o destino;

E do que me sobrar a esse refino, favor subtrair de minhas somas!

Para expulsar de uma vez meu indigesto eu dessa grei;

Onde só aprendo o que não sei e me sinto esquecido em pleno leilão;

Um destronado leão, sem direito aos deveres da justa lei;

Um cansado ex-rei, apegado ao seu cetro-plebeu de solidão!

Palmas para mim, sou ou não sou a piada da hora em questão?

Nada de lealdade ou traição, só me dão esse vão de descaso confuso;

Sinto-me um mal vindo intruso, nessa verdade que é pura alucinação;

Esqueçam de vez meu coração - por ninguém lhe querer, ele já nem uso!

Reinaldo Ribeiro
Enviado por Reinaldo Ribeiro em 18/11/2008
Reeditado em 23/12/2008
Código do texto: T1290491
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