restos
Quero a urgência dos amantes suicidas
Quero o destempero dos desesperados,
dos atônitos
Quero olhos, bocas, pernas e suor
Irrigando os lençóis abandonados
na noite escura
Implorando por vida
quero o beijo mais evasivo
que me penetre
e, me confunda
e depois de todas as juras
quero a traição banal
na esquina
sem pudores falsos de castidade
quero a última taça da ceia
e ,o sal derramado na mesa
os desperdícios matinais
a pingar gotas e restos por
toda a vida
A vida é de restos...
Vivemos os restos de nossos dias,
Vivemos os restos de nossas forças
Vivemos de restos de imagens e
emoções
carregadas num corpo que nos
resta depois de
apenas sobreviver
quero o resto de sua juventude
quero seu sorriso irônico
e certeiro
a flechar meus brios
de pequena burguesia,
de pretensa dama antiga
agarrada em rendas e anáguas
inúteis...
tecidos a tramar imagem
poluída pelo tempo.
quero o resto de seu corpo
embalsamado nesse momento
que será irrepetível
que nunca volverá
a acontecer, nem perante suas
retinas
e, nem perante as reticentes primaveras
a espalhar polens contaminados
de lirismo
a nos dar flores para túmulos,
para igrejas,
para as moças,
para os românticos
,e para as crianças que principiam
a cerzir
restos de umbrais...
a poesia é resto
sem quociente,
sem multiplicação,
sem divisão
é resto aritmético de toda a humanidade
contida e concentrada
numa inspiração.