Inferno Diário
Acordo no mesmo dia que vou dormir
Abro os olhos sem dificuldades, sem vontade.
Sinto a dor em minha coluna
Latente, persistente, diária.
Sento-me a cama sem querer erguer-me.
Não há vida em meu quarto
Não há nada fora dele.
Levanto-me com esforço
Forço cada passo meu.
Meu corpo reclama por comida
Como sem dificuldades, sem vontade.
O percorrer do dia é solitário
Sem sentido
Sem amigos
Ninguém.
Sou apunhalado pelas mortes de meus filhos.
Desligo o telefone
Sei que jamais irá tocar.
Na rua ouço música
Fones de ouvido, mp4, minha fuga da realidade.
Assim evito a todos, a tudo, a mim mesmo
E sigo para qualquer lugar, para lugar algum.
Essa é minha vida.
O que restou do que poderia ser uma vida.
Jamais tive chances
Nunca terei, eu sei.
De madrugada irei dormir... Apagar pelos efeitos das drogas
Somente no reino inerte e inconsciente não há dor.
Meu coma induzido e temporário.
Para despertar no meso dia
Abrir meus olhos sem dificuldades, sem vontade
E passar pelo inferno diário mais uma vez.