Anencefálico
Nasceu de um ventre humano
úmido e quente.
Fruto de amor ou do acaso.
Preenchido de natureza contraditória
e expectante
Expectorado ao nascer,
respirou timidamente
Ainda sem chorar,
quando então o médico lhe
deu a primeira palmada
E, então, afinal grunhiu fremitamente.
Depois da assepsia
já se encontrava tranqüilo
e lânguido postado
nos braços da enfermeira
Que o levava para formalmente
conhecer a mãe...
E, o engraçado é que fora gerado
exatamente dentro dela...
Só a conhecia por dentro...
Conhecia seus desejos e sentimentos,
Mas não sua face.
Em seguida, o médico
constrangido narrou a trágica
característica de seu filho:
era anencefálico,
sem cérebro,
era oco o coitado e,
sobreviveria
mui brevemente...
E, nada há que a medicina dos homens
possa efetivamente fazer,
A não ser permanecer perplexa.
A mãe em choro compulsivo,
Alentava o recém-nascido...
Em exercício intuitivo de sua maternidade latente
Será que não sofre?
Será que é dolorido ser assim?
Mas porquê, se parece estar tão tranqüilo?
Horas depois, seu último
suspiro findou aquele pequeno drama.
Mais perguntas assaltam sua mente:
O aborto teria evitado o trauma?
O aborto teria lhe abreviado sofrimento?
Tantas perguntas...
É a vida.
Ainda assim, é humano.
O imperfeito, o incompleto
e salutar humano...
Apesar disso, de toda sua humanidade,
Ainda não era aceito.
E, se era aceito, era por breve momento.
Vivemos a ilusão de brincar de ser Deus...
E, Deus deve rir muito dessa nossa
pretensão.
E, Deus não nos abortou de seus planos.