INFÂNCIA QUERIDA, INFÂNCIA PERDIDA



Trago no rosto sinais do tempo
- erosões que os anos imortalizaram -
olhar vazio restringido às cercas
que os longos dias delinearam.

O rosto lívido como a espuma -
guirlanda solta sob as águas -
expõe no espelho a imagem informe:
superfície das minhas vagas.

No espelho eu vejo o meu passado de glórias,
festas e estripulias, sinais de um tempo
que está remoto, reflexos foscos de luzentes dias.

O esconde-esconde, gudes e pipas, a queimada
e as peladas nas ruas, rouba-bandeira, o pega-pega,
o estilingue buliçoso... o carrinho de rolimã.
Meu DEUS quanta coisa passou de carreira.

Em dias de chuva brincar de pés descalços
nas ruas que se tornavam tobogãs...
O perigo não existia, tudo era festa!
Peito aberto, calção de chita, joelhos ralados pelos tombos
nas apostas das corridas nos velhos parques...
Hoje são lembranças retratadas
nas cicatrizes que ficaram... É o que resta!

Quem me dera pudesse pelo menos por um minuto,
voltar aos prados da infância!
Reviver as utopias que ficaram do outro lado
dessa colossal distância!

As tantas páginas que o tempo escreveu
nas tábuas do meu coração, sobre as quermesses,
os piqueniques sobre as relvas das verdes praças, as aventuras...
São grilhões essas lembranças, são instrumentos de torturas.

Aqui, debruçado na janela da saudade,
ainda posso sentir o cheiro de tinta fresca no ar,
exalando dos versos dos bilhetes que eu te escrevia,
declarando o meu amor.
Estes fragmentos do passado são faíscas a me queimar.

Passou a doçura dos verdes dias.
Lembro-me das missas dominicais vespertinas
que serviam muitas vezes de pretexto
para os encontros proibidos, o namorico com as meninas.

Os corações desenhados nos cadernos
sempre com aquela velha frase:
EU E VOCÊ,
dentro deles e ainda em destaque
o
I LOVE MY LIFE BECAUSE MY LIFE IS YOU!
Ahhhhh!!!!... Tempo maravilhoso aquele!
Foi um tempo eviterno de lindas festas e estripulias,
que me fez sentir no peito divinas emoções.
Hoje, tudo isso compõe as páginas
do meu doce livro de recordações!

Passaram os meus verdes dias,
murcharam as minhas verdes folhas,
desprenderam minhas belas pétalas,
o meu pólen expirou.
Meu perfume foi com o vento envolver outros jardins
lá para as bandas de outras terras, bem longe de onde estou.

Não me entristeço com a separação
entre eu e o meu passado de tantas glórias.
Me entristeço é com o presente
que, com seu malévolo despeito,
privou-me eternamente dos prazerosos
dias áureos da meninice,
mortificando a alegria aqui dentro do meu peito.

Espelho, espelho meu!
Quanta coisa vejo em ti guardadas.
Você reflete os meus presságios e me deixa assim...
Oh, meu espelho as palavras que aqui expresso
são suspiros da minha alma,
são lastimosos ecos da minha infância que se foi!
Que para sempre se foi!...
Pobre de mim!
Pobre de mim!

luznaentradadotunel
Enviado por luznaentradadotunel em 09/05/2008
Reeditado em 06/01/2010
Código do texto: T982118
Classificação de conteúdo: seguro