EI... VOCÊ QUE VEM DE LÁ

A você que vem de lá

Vou lhe pedir um favor

Me traga algumas coisas

Que lá no passado ficou

Não por vontade minha

Mas deixei minha terrinha

Porque a vida me obrigou

Traga as noites serenas

A brisa fresca da alvorada

O luar daquele sertão

A calmaria da madrugada

O brando mugir do gado

O aroma do café coado

E o cheiro da batata assada

Quero o piar da cotovia

O lamento do acauã

O murmúrio do riacho

Na alvissareira manhã

A água fresca da mina

O verde vivo da campina

Depois da chuva temporã

Traga o puro doce da cana

Num pedaço de rapadura

Uma boa medida de goma

Preparada sem mistura

Um cuité de boa farinha

Uma cuia de canjiquinha

E uma vasilha de gordura

Quero um rádio de pilha

O choro de uma vitrola

O canto do sabiá

Vivendo fora da gaiola

O tropel do meu cavalo

O velho cantar do galo

E uma toada de viola

Traga a poeira da estrada

O som de um berrante

O velho carro-de-boi

Com seu rangido marcante

Meu tempo de candeeiro

E o grito do boiadeiro

Ecoando muito distante

Quero a alegria das tardes

O sol caindo no poente

Toda arte bonita no céu

Trazendo saudade pra gente

E o latido do perdigueiro

Meu cachorro companheiro

Guardando a porta da frente

Traga dois dedos de prosa

Nas noites, com meu avô

Os causos de antigamente

E as estórias que ele contou

Sentado em um banquinho

Com aquele jeito mansinho

Que saudade ele deixou!

No baú das minhas lembranças

Para sempre eu vou guardar

O grito da minha avó

Me chamando pra almoçar

"Vem menino, está na hora!

Venha logo, sem demora!

A comida vai esfriar."

Poeta Ed Soares_ 28/10/2024

(Em memória dos meus avós: Altina e Valentino. Saudades eternas).