Revista do Meu Eu
Revistando o passado
Vi-me no ventre da minha mãe
O alarido externo aguçando a minha saída
O sol por entre nuvens e desejos
Contando os lentos dias dos nove meses.
Revistando o passado
Senti as dores da minha mãe
Numa contração idílica
E eu num desejo frenético
Vibro na piscina do líquido amniótico.
Revistando o meu passado
De olhos ainda semifechados
Pude sentir o poder da luz do dia
E o meu choro arrepiando a alma de papai
À volta da bacia, ao lado da suada parteira.
Revistando o passado
Tive a minha primeira embriaguez
Ao sentir os carinhos
E poder mergulhar de corpo e alma
No líquido dos seios da genitora.
Revistando o passado
Recordo-me dos meus primeiros passos
O meu pai feito guarda-costas
E eu desafiando o chão
Ao brilho do olhar de mamãe.
Revistando o passado
Vi o tempo passando
O meu crescimento aguçando a puberdade
Encontros nos trilhos da escola
As fases de mim respirando a liberdade.
Revistando o passado
Primeiro amor, primeiro beijo...
A primeira sessão de cinema
Aquela pipoca e o sorriso
Os arrepios vibrantes feitos guizos.
Revistando o passado
Aquele matrimônio e sonhos
As flores perfumando o altar
E o sim à pergunta do padre
A festa e a felicidade incontida
Revistando o passado
Eu que era o esperado
Agora a minha ânsia aflora
À espera do rebento
E do choro feito o meu.
Revistando o passado
Agora o espelho é a minha fonte
Cabelos brancos pelo tempo
O tempo no berço do vento
E as rugas são os labirintos da saga.
Revistando o passado
O hoje, eu na palhoça
Netos à minha volta
Eu da história, a um ancião
Vasculhando as doces memórias.
Revistei o passado
De outro plano vejo princípio
Que era o verbo
O outro lado da vida
Daqui sou um mero historiador.
Revistando a viagem
Com lápis e borracha
Não escreveria e nem apagaria
Faria o mesmo trajeto
Deus a minha sina traçaria!