Ontem

Minha avó ontem me disse

Que morou em outro ontem

E nesse ontem morava um ontem

Que tinha bisavós.

Elas tinham dedos miúdos de rosário debulhado

E risadas chiadas, com cheiro de café.

Elas, as velhas.

Não digo porque eram velhas,

Ou porque errado fosse.

Mas eram velhas de rugas e cânfora,

Coisa que agora estou me tornando.

No meu amanhã já moram incontáveis ontens.

E muitas velhas e muita cânfora.

E dedos cada vez menores,

Que não debulham milho, nem rosário.

Só tateiam a amargura do tempo

Nos elásticos frouxos da cara.

E são dedos que apontam ternuras

Em cada ontem que aprecio agora.