Saindo do ninho
Minha avó lustrou as asas da minha mãe, e na hora certa ela alçou voo.
Um voo lindo, com muitas conquistas, pousos, e duas "passarinhas".
O ritual se perpetuou, e minha mãe também lustrou minhas asas,agora chegou a minha hora de alçar o voo.
Neste instante, o medo partilha espaço com a expectativa pelo novo.
Minha mente nutre uma porção de "E se".
E se:
sentir falta do ninho? ;
o ritual terminar em mim? ;
eu me tornar um pássaro solitário que vagueia e não consegue pousar em canto algum?;
eu fracassar no trajeto, quem irá curar minhas feridas asas?
Afinal, o que o meu trajeto reserva para mim?
Meus pés beiram o ninho, mas meu coração insiste em sentar diante de uma cozinha cheia de mil memórias.
A verdade é que eu não sei lidar com despedidas, nem com o até logo, nem com o adeus, pois para mim até as rupturas momentâneas soam eternas.
Apesar do temor, se faz necessário aceitar, não sem dor, que é hora de ir.
Em algum momento vou conseguir me desprender, mas por hora sigo esperando a receita de família ficar pronta, marejando a mesa que marcou nossas três gerações.
"Hoje me vi ligando para minha mãe, pedi a receita da sopa de ervilha que minha avó fazia para ela. A história se repete mais uma vez..."
"A saudade vai chegar e por favor meu bem
Me deixe pelo menos só te ver passar
Eu nada vou dizer perdoa se eu chorar"
( Roberto Carlos / Porquê nós 3 amamos)