VELOZ
A saudade, se a gente não mata, nos mata, arranca tudo.
Arranca o bicho macho da floresta para ver a fêmea, onde quer que
esteja, arranca a avó do sofá para ver o neto em qualquer lugar,
arranca os sinais, liga as sirenes, derruba as horas, segue à velocidade
da luz para nos salvar no seu abraço.
A saudade, para não nos matar engana a dor com algum chocolate,
algum humor, algum sabor diferente de fazer florescê-la desde a
semente.
A saudade, para não nos matar nos blinda com as obras artesanais, os
dedos do violão, as palavras ramificadas de sua essência bebidas na
água de sua própria sede.
A saudade, para não nos matar nos move para o jardim florido das
memórias, de onde visitamos os momentos mais ternos e belos de
nossa história.
Há muitas saudades em nossos corações, saudade das intenções puras
que não se cumpriram, das promessas de amor desfeitas, dos encontros
que nunca houve, das palavras que nunca dissemos, dos momentos
que nunca vivemos.
Há muita saudade em nós, da voz que calou e não ressuscita porque o
rolo compressor do tempo a esmagou, do café com afeto, do roçar do
copo brindando nossa intensidade, da algazarra da mesa inflada de
euforia, das mãos que se entrelaçam num encontro inefável de alegria.
Lembro-me do momento em que nos conhecemos naquela tarde, a
saudade me pegou pela mão e me levou para ouvir aquela canção dos
tempos de chuva e amor, emoldurados em forma de arte no coração da
tarde.
A saudade, para não enlouquecer grita socorro, nas janelas, nos
corredores, nas vilas, nos morros.
Há muitas saudades perdidas nos olhos tristes da vida,
há uma saudade veloz, há uma saudade em maio desassistida.