POEMA PARA O MEU PAI

Pai!

O teu nome evoca

em minha lembrança

teu vulto excêntrico

e original

de burguês bonachão

e jovial...

Seguravas minha mão

e me levavas a passear

pela cidade

na beira do velho cais

a ver navios...

e os balaios de frutas

verduras e camarões

que os ilhéus traziam

aos trambolhões...

Mastaréus de barcos ancorados

e velas coloridas

balouçando sobre as ondas

à sombra histórica

das torres do passado...

– Maresia...

E o bonde?

e a praça...?

cheia de graça,

riscada de sol

pálido...

como as areias

esvoaçantes

das aldeias...

O calor da tua mão...!

e o compasso cadenciado

da bengala de bambu

com taco de metal

batendo nas pedras da calçada

com tinido sem igual!

e os teus olhos...?

sempre fixos

mais além, no horizonte

contra o sol...

como a buscar uma resposta

para tudo...

e mudo a dizer:

– Eu não sei o que fazer!

E a tua roupa surrada...

sempre a mesma...

e o teu gesto aparentemente

indiferente

com a gente...

Cigarro de palha entre os lábios,

relógio de ouro na algibeira,

com medalha de Napoleão...

e chapéu desabado na cabeça

Velho pai!

Foram poucos os momentos

que em silêncio me guiaste,

pela mão, durante a vida

mas te digo mesmo assim:

– Muito obrigado!

porque nunca me bateste

e assim mesmo me ensinaste

que somos todos muito iguais...

e se a vida nos distingue

por ventura,

a dor nos nivela por inteiro...

e que a morte, por derradeiro,

nos despoja das vaidades acessórias

e de todos os metais...

e em tormentos

num instante

nos ensina muito mais...

a nós todos tornando solidários

nesta escadaria

sem degraus...

Attilio dos Santos Oliveira
Enviado por Attilio dos Santos Oliveira em 16/04/2020
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