Liberto

I

Nós éramos perfeitos anjos, um ao outro: dois formidáveis.

Uma entrega total. Talvez tenha sido esse o nosso erro?

Não, tenho resposta melhor. É muito mais o que se afirma:

é porque não há espaço no mundo para um amor liberto.

Esse mundo nos trouxe à uma vida em contra-amor, num emperro.

Fizemos o que, de fato, não amávamos:

Falhamos, erramos, mentimos

Magoamos, pisamos, sucumbimos

Nos encontros e desencontros

de fatos, tais como humanos outros

que jamais estarão plenamente felizes

enquanto esse mundo seguir em horror.

Por isso não havia e nunca haverá um local pro nosso amor.

Porque estávamos.

Éramos.

Estavam os nossos corpos,

Eram nossas mãos, seus olhos nos meus.

Eu estava e você me recebia.

Eu me deixava dominar e você por cima.

Você me abraçava e suspirava

Eu te envolvia e te beijava.

De outra maneira eu não vejo as nossas diretrizes.

Pois, vejo que a vida nos deixou o melhor que podia compor.

E seu rosto, seu olhar - que belo legado!

Tudo apontava para a eternidade inalcançável, um perene clima

diante da realidade sorrateira que nos cercava.

II

É como seguem os dramas: como todo amor impossível,

Ainda prossigo te amando.

Liberto.

Mesmo que estejam me matando.

Mesmo que nada façam.

Mesmo que tudo esteja se realizando.

Mesmo que me odeies e que as tuas memórias... nem me reconheçam.

Em teu olhar, nesse belo rosto charmoso de delicada pinta, acima

do lábio superior de teus beijos

Não consigo e nem quero

Não posso e nem desejo

Não contenho e nem vasculho

sequer os limites do começo da profundidade

do que significa esse amor liberto, com todos os puros trejeitos

cuja obviedade confirma

que, entre nós, não havia esbulho

mas a presença plural de musicalidade

de nossos corpos no instante sincero

de posse e libido, em secreto e pacífico vilarejo.

Talvez o peso desse amor... eu não possa suportar.

Mas quem pode afirmar?

Negar eu não irei: vou te amar.

Até o momento derradeiro.

Somente não gostaria de ir sem, antes, te ver.

Ao menos apreciaria, de/com corpo inteiro,

você, do meu lado. Ali, a te perceber.

Mas nosso instante... antes de nós, partiu. Sabíamos. E vagueia a dor...

III

Carrego o teu amor, pois ele é seu. E olho adiante, liberto.

Sim, sem duvidar

pois, eu digo a ti que, embora tudo passe

"sempre terás um homem que te amará - perfeitamente"

Pois somos um conteúdo e uma forma

Um inspirar e exalar

Perpetuamente

Mas esse mundo! Ah! Como eu odeio o que o mundo transforma

modifica e altera e perpassa

desvanecendo em pálida indiferença, como se tudo embranquecesse.

Era como se a inveja, sobre o mundo, viesse

contra nós, causando toda a dor!

Mas, tudo passa! Eu sei.

Exceto as nossas vidas naquele amor.

Ah! Eu sempre. Eu sei.

Sim! Você também. Eu sei.

Nós éramos como os anjos: perfeitos e inalcançáveis.

Para além da eternidade nos amávamos.

Lá, formidáveis éramos. Estávamos,

Mas ainda não. O tempo não nos deixou indomáveis.

Eu insisto: deixe que eu leve nosso amor - suave fardo! Não me importo

desde que somente me encontre lá, ao fim, em seu eterno abraço.

Tudo vai se resolver. Eu sei! Tudo naquele lugar angiporto.

Afinal, tudo foi nosso. É de todo, sim, em desembaraço.

O todo nos pertence: aquele amor liberto.

Me bastaria, agora, te ver por aí,

sorrindo, como as belas tulipas em holandesa primavera.

ALIVAVILA
Enviado por ALIVAVILA em 06/04/2020
Reeditado em 11/08/2021
Código do texto: T6908010
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