Tio Vicentão
Para tio Vicentão, o mais belo
e longo caminho de volta nunca feito.
Ele chegou em casa perto do meio-dia.
Sempre foi assim: chegava sem aviso
e saía sem deixar rastro, despedidas
eram migalhas indignas de sua presença.
Tomou banho e se convidou ao almoço.
Usava bermuda jeans mais suja
que meus olhos infantes
jamais viriam na vida,
um sapato tão roto
quanto as estradas
por onde caroneou
e uma camisa amarelada
que fora branca um dia,
aberta a mostrar o peito cansado
de sol e estrada.
Almoçou. Descansou.
Cochilou sentado
no banco da varanda
como pareceu fazer
em todo banco
que encontrou pelo caminho.
De repente, acordou, levantou,
vestiu sua camisa cansada
dele mesmo
e calçou o tênis de meu pai
menos roto que o seu deixado
no batente de casa.
De pé,
pronto para mais uma jornada,
passou a mão na minha cabeça
e disse a meu pai: Zé,
vou na casa de sua mãe
daqui a pouco volto aqui.
30 anos depois, eu ainda espero.