REVIRAVOLTAS
REVIRAVOLTAS
“Na poeira do velho estradão/ Deixei marcas do meu coração / E nas palmas da mão e do pé / Os catiras de uma mulher.”
Rolando Boldrim in “Eu, a viola e Deus”
Se um dia tu voltares, volta em paz.
Não voltes por ter medo do futuro.
Não nos cabe senão em horas más,
A angústia d’um final tão prematuro...
Mas se o passado não ficou p'ra trás,
Tampouco esse momento ainda obscuro.
Que a pretexto de andarmos sem perigos
Afasta tanto amigos que inimigos.
Não voltes porque temes triste fim!
Não voltes pelo tédio do presente!
A vida pode ser assim-assim...
Contudo, a solidão é inclemente:
Leva-nos a alegria até que, enfim,
Não haja razões p’ra seguir em frente,
Deprimindo-se o ânimo d'um jeito
Que é difícil deixar o próprio leito.
Não me tenhas como um cara-de-pau
Arrependido de erros do passado...
Sentado a t’esperar n’algum degrau
Recordo antes o ardor que, enamorado,
Em boa hora esqueço o dia mau.
Apenas em ficar bem ao teu lado.
A culpa como fardo se carrega,
À espera d'um perdão que tarde chega.
Mas, se a necessidade faz a lei,
Um estatuto inteiro escreve o amor!...
A única conclusão a que cheguei
É de que não se vive sem temor
De perder as batalhas que enfrentei
Em tratados vazios de valor:
Pouco valem papéis e seus dizeres
Quando tratam d'amores e quereres.
Dizem ser o melhor tempero a fome
Como excelente ao sono é a fadiga;
O desejo em ardor se nos consome
E d’amores a noite é boa amiga.
Tu, minha bela, tens da luz cognome.
E hoje, teu doce olhar mais se bendiga!
Luze na escuridão que nos rodeia
E traze bons sabores para a ceia.
A mágoa, n’esse arfar, tão logo fuja
Nos permita o prazer e seu mistério.
Teus beijos a lavar-me a boca suja
Venham me redimir como homem sério
E me rabisque a rude garatuja
Onde te poetei fútil vitupério...
Após eu difamar teu nome aos berros,
Enfim haja perdão para meus erros!
Encontre o meu olhar o teu olhar
E a tua mão descanse sobre a minha.
Eu possa uma outra vez te acarinhar
Enquanto a tua nuca se avizinha...
Penso eu cá do teu lado sossegar
Para tu não dormires mais sozinha
Se te alcanço os favores, mais e mais,
Com sussurros abafo ora teus ais.
Aos martírios da vida não se some
O mal-de-amor de que falam os sábios,
Sim a arte de amar mais se retome
À leitura de velhos alfarrábios.
Pois quando à morte sei ser o teu nome
Que, sofregamente, hei-de ter nos lábios...
É o amor uma morte, ainda e enfim,
Se um dia tu voltares para mim.
Sobrália – 02 02 2014