Poema escrito à cabeceira de seu túmulo

Celeste Bressan Damasio

15/04/1941 – 07/03/2015

Lê-se em uma dedicatória de bronze:

''Ninguém morre enquanto permanece vivo no coração de alguém''

Se viver é pulsar corações

Agitar memórias

Dirigir criadouro de emoções

Então ninguém nunca foi embora.

Se viver é ter documentos

Objetos

Costumes

Filhos

Sob seu sobrenome escrito

Então os túmulos estão vazios:

Todos estamos vivos.

Minha crença floreada conta o seguinte

Os mortos nunca nos deixam por inteiro

Apenas perdem a noção do limite.

São, portanto, crianças indomáveis por direito.

A atitude tomada sobre a possibilidade do infinito

É dominar, é ver-se literalmente no outro

O morto pode invadir qualquer coisa à gosto

Enxergar pelos olhos do gato, esconder-se nas gavetas

Deitar no miolo das flores, comandar grupos de passarinhos,

Pode ser qualquer coisa: objeto, animal, céu, árvore, pessoa

Principalmente se sua vontade é nos bisbilhotar de pertinho.

Não há consolo melhor em pensar que

Quem eu amo pode ser o sol que me esquenta

O cafuné que me conforta

Pode correr pelo meu sangue, ser o que me alimenta

Pode ser aquela criança que aleatoriamente

Me bombardeou com seu sorriso

Aquele vendedor que do nada

decidiu simpatizar comigo

Pode ser a poeira dos meus livros

A música nos meus ouvidos

Tudo o que eu amo pode ser quem eu já amei

Tudo pode ser uma despedida contínua