HIPOPÓTAMO NO CIO

Saudade é grito sem remetente

e de mansinho toma conta de tudo

como praga que se alastra sem dó.

Suas garras são implacáveis, não perdoam nada

não deixam nada fugir, nada mesmo.

Pode-se sentir saudade do que fez bem,

e do que foi mais amargo, mas seco, mais podre.

Também temos saudade de alguns cheiros,

alguns horizontes, alguns chãos já pisados,

alguns corações já fecundados.

Dá saudade alguns pensamentos,

algumas vozes, alguns encontros,

alguns tropeções sem pé nem cabeça.

A saudade também vem dos sonhos ungidos

e daqueles que fizeram nossa alma rodopiar,

que deixaram nossa fé jogada num canto qualquer.

Dá saudade do que refez nossa pele,

que tirou nossas ideias do caos,

que fez nossos medos virarem limo.

Dá saudade daquela melancolia sem nexo, sem cabresto,

que nos amamentou sem mandar boleto,

que pousou com a delicadeza de um hipopótamo no cio.

Aquela melancolia em banho-maria repleta de miçangas açucaradas

que a gente guarda sem saber o porquê

que nos envolve numa larica soberba e desengonçada.

Aquela que quando nos damos conta já apaixonou nossos poros,

virou chaga implacável que nunca mais some de vez,

nunca mais vai deixar de latir, de atiçar, de tingir nosso chão,

de fazer gato e sapato de todos nossos rincões.

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Oscar Silbiger
Enviado por Oscar Silbiger em 30/04/2016
Reeditado em 30/04/2016
Código do texto: T5620614
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