Cântico de Duas Saudades
À Memória de meus filhos Gêmeos (8 semanas de gestação),
Mortos a 04 de Janeiro
de 2016.
Eram dois ínfimos sóis que já enchiam o horizonte ainda taciturno com seus lumes ingênuos, anunciando a chegada de uma aurora risonha. Como ansiávamos ver essas luzes fulgurarem nas nossas frontes apaixonadas. Como desejávamos que esses pequeninos astros nos atraíssem para si, no seu ritmo célico, nos convidando a uma sinfonia inolvidável que arrebatasse nossos espíritos e os mergulhassem no véu fino dos arcanos divinos.
Ah! Mas tudo ficou sob o signo maldito dos silêncios! As auroras de nívea luz se converteram em sombras de um crepúsculo soturno. Os risos cândidos foram silenciados pelas mãos gélidas do destino, que indiferente aos corações esmagados escreveu a sina dos mortais nas arestas do Tempo! As luzes que acreditávamos imarcescíveis se apagaram ante o ocaso tétrico e impiedoso, impassível às lágrimas da terra. Esses dois grãos da Eternidade gerados na madre jovem do desejo foram varridos pelos ventos rutilantes do inesperado. Como dois sonhos de uma única noite de segredos, eles foram dissipados pelas forças do desconhecido.
Eram dois proêmios de uma mesma obra, dois prelúdios de uma mesma sinfonia, dois versos de um único poema, duas variações de uma mesma canção...
Não! Não haverá mais leitura desses prólogos, pois a tinta que os escrevia maculou o papel pardacento das nossas vidas. Não ouviremos os prelúdios angelicais da sinfonia! As espessas cortinas vermelhas do palco jamais se abrirão para que o espetáculo comece e a música pervada tudo! Os versos que esperávamos que se desprendessem da folha dourada do poema e ganhassem vida nas palavras estão agora apagados! E a canção, que embalava esse devaneio, carrega tristemente o selo dos silêncios!
A melodia inexistente dos choros dos infantes misturados aos zéfiros sobranceiros já nos faziam andar pelos caminhos e descaminhos do mundo onírico; que sensação incrível era sonhar sem estar sonhando! Fantasia, imaginação, sonho... Tudo se desmanchou na leveza pesadíssima do ar! Curiosidades, expectativas, promessas... Como todas essas palavras se tornaram tão frias e sem sentido!
O meu estro foi quebrado como Lira infausta sob o peso dos infortúnios! A minha razão se tornou vacilante e tresloucada ante a ingente derrocada dos meus sonhos pueris! Vida que se vai esvaindo morosamente por entre as mãos que esperavam segurar firmemente o futuro! Minhas esperas todas subvertidas diante de uma imagem do vazio, de um nada que me desconserta, que cinde meu ser, rompendo a lucidez que, ora incitava a minha imaginação em direção a posteridade, e agora me precipita no silêncio incógnito do absurdo!
Minhas palavras vacilam, enfraquecidas pelas forças contrárias do prélio desabrido. Meu coração... Ah meu coração! Palco da desdita, da desventura que se abateu sobre mim como uma inclemente tormenta. Meu pobre batel vaga no mar enfurecido das incertezas, ameaçado pelas intempéries do desatino! Delírio e angustia se tornaram minhas companheiras nessas horas fugidias de desgosto que acossam e assombram meu flébil espírito!
Prometo a vocês, minhas duas vidas, minhas amadas almas, que tentarei ser forte! Nunca me esquecerei de toda alegria que vocês trouxeram enquanto estiverem entre nós! Não permitirei que sejam delidos das nossas memórias! Eu eternizarei vocês na força do meu amor! Nas minhas reminiscências eu guardarei vocês para sempre! Tudo que a memória ama fica eterno!
Voltem para a Eternidade, minhas Gotinhas de Amor! Retornem para o domo do Infinito, para o primeiro Lar de vocês, os céus de Luz! Regressem para os empíreos mundos de alegrias infindas! Descansem, meus amados filhos nos braços de Deus-Vida! Sejam as estrelas silentes a me mostrar o caminho nas noites escuras dessa vida! Não é um adeus, mas, um até logo! Um dia eu os conhecerei, minhas vidas e meus amores! Que Deus, o Pai Primeiro, tenham vocês sempiternamente em seus braços de Amor!
Saudades do seu pai,
Adriano Luchi