Para Lurdes Bispo de Jesus (1940-                                                            2008), minha babá, saudade sempre.

Com você,
Tantas coisas se foram
Que nada é sequer a sombra do que foi...
Debandaram as aves da alegria
Os suaves trinados da inocência
Agora vivo só aquilo que sou.

Quando você partiu, portas se fecharam
E os salões da memória
Emsombrecidos
Apagaram-se em vazio incolor.
Sua voz
Seus gestos vagarosos
Suspensos no éter do tempo
Brancas nuvens
Figuras exatas desta dor.

A casa em que vivemos já não existe
Porque existir está além de ser...
Nunca mais a merenda ao fim da tarde
A paz insuspeita da tenra idade
Infância, acalanto, amor.

Os perdidos domingos da lembrança
Meu pai, descansando da longa semana
A casa pulsando ao nesso redor...
Estão perdidos porque vividos
E não se vive de novo o mesmo amor.

A escola, as provas, a esperança
A idade se forjando em minha alma
E você, voz carinhosa
Chamando o menino
Que você ninou e viu crescer.

Ah! Pudesse a voragem do tempo poupar-nos
                                                        a lágrima
Quando a mente resgata dentre as sombras a luz

                                                         maior
Eu encontraria para esta elegia o sorriso
                                                         leve
Que anos de chumbo riscaram do sorrir.


Voltaria a descer as longas escadas
Ligar a TV
Perdidos no Espaço
Viagem ao Fundo do Mar

Minha mãe ainda tão moça
Meu pai me chamando para brincar...

Com voc~e, partiu o que jamais fica
Por mais que queiramos preservar
Segue em frente
O céu lhe espera
Daqui fico a relembrar...

E que não pulse nesta lembrança
Nem mágoa nem amarga desilusão
Nalgum lugar
Aquela criança ainda espera
O carinho sempre terno de sua mão.