Amor de Pai
Eu sou, eu sou trabalhador do sertão
Casei com a mais perfeita, esposa, minha mulher
Muitas vezes suei para por na mesa só um pão
Mas nessa família nunca faltou fé
Com ela eu tive quatro meninos
E apenas uma menina, uma menina
Augusto, Cesar, Caio e Lino
E Elza, bela morena, cintura fina
As crianças foram crescendo
A vida ficando cada vez mais dura
Sei, que velho, vou morrendo
Para a dor da morte não há cura
Os mais velhos, Cesar e Augusto
Saíram de casa mais cedo
Aquela despedida foi um susto
Eles disseram que iam a Penedo
Acho que Caio era meio doido
Talvez a melhor ideia era ele ficar
Na cidade esse menino não tem chance
Seu futuro seria conosco morar
O que me preocupa é esse gado magro
Rio cada vez mais seco
E a Terra cada vez mais quente, mais quente
O meu plantio sem chuva causa um estrago
E essa fome “é nós que sente”
Nessas terras há lendas esquisitas
Falaram que há um monstro nesse poço
Que come as frias marmitas
Dos filhos dos moço’
Se existe algum tipo de mostro aqui
Só se for o mostro do calor. “Que calor!”
Ingrato, Maldoso. “Saia já daqui!”
“Não vê que nos provoca tanta dor?”
O pior de tudo é ver dona Simone
Mais uma mãe a sofrer
Seus filhos fugiram da fome
E parece que vão deixá-la morrer
Também sou mais um pai de família
Com o coração cheio de saudade
Três meninos e um filha
Vivendo juntos na cidade
Os anos lentamente se passarem
E eu já sabia que isso iria acontecer
Meus filhos ainda não voltaram
Mas em momento algum deixarei de crer
“Quero meus filhos agora!”
“Deus, por que os tirou de mim?”
Eu sofro calado,
Minha mulher chora
“Por que a vida nos fere assim?”
Eu devo estar com problemas de cabeça
Minha filha desde pequena gritava “Pai”
Era uma emoção tão grande
Que hoje eu a imploro “Não vai”
Quando trabalho, penso
Em escrever uma carta
Mostrando meu amor imenso
Sonhando com uma mesa farta
“Será que me esqueceram?
Deixaram seu pai de lado?
Será que eles não sofreram
Na hora de terem viajado?”
Nessa noite sonhei com Lino
Sonhei que ele fosse um bombeiro
Vestido com aqueles trajes finos
No centro do Rio de Janeiro
E quando me acabava a vida
Presenciei o maior gesto de carinho e afeto
Para o céu, já escrevia a minha subida
Mas antes Elza me trouxe o primeiro Neto.