MAR REVOLTO NA ILHA

Macau nasceu do mar revolto

E se estendeu pela terra,

Com o seu povo de salineiros e de pescadores,

Ouvindo e aprendendo o Marulho Bravio das ondas.

O destino quis que ela tivesse um nome

Evocativo das longas e aventurosas

Viagem aos portos do longínquo Oriente.

Um nome que se pronuncia imaginando

Iates, gôndolas, falúas, barcos de velas brancas,

Gemendo cantigas de gajeiros.

E arfando nas enseadas de países distantes.

Mas, no burburinho de tantas sugestões

Românticas que esse nome desperta,

Ninguém conseguiu fazer ressurgir

Do abismo em que se afogou

A Ilha de Manoel Gonçalves,

Tal como nos aparece na imaginação

Sempre disposta a iludir-se e a sonhar,

Não foi nenhuma dessas cidades

Contra as quais a ira oceânica

Desmandou-se implacavelmente.

Era uma feliz Aldeia de pescadores

Sem vícios nem crimes que chamassem a si

O castigo dos elementos.

O mar em luta com a terra,

Enrolava parcéis e recifes,

Arrastando-os no dorso das vagas.

A humilde ilhota de pescadores,

No meio do tremendo campo de batalha,

Assistia inquieta às escaramuças

Que arrancavam pedaços do seu solo.

E enfim, um dia, apenas ficou

Por sobre a imensidão oceânica

O pugilo derradeiro de terra,

Pedestal de uma cruz que abria os braços,

Clamando e perdoando os habitantes

Fugidos da ilha condenada

E moradores da margem direita

Do rio foram em procissão de ladainhas e preces,

Buscar o Cruzeiro que o oceano havia respeitado.

E em Macau os seus primitivos povoadores

Continuaram a amar e venerar os velhos santos,

As queridas imagens e a cruz que abençoara

A agonia da Ilha perdida.

Foi assim que morreu,

Há muitas dezenas de anos,

A Ilha de Manoel Gonçalves,

Afogada no delta indomável do Rio Piranhas.

Mas, do amarfanhado lençol marinho

Que a sepulta – Ela por vezes aparece,

Como uma Vitória Régia, numa ressurreição.

As suas ruínas, as pedras das suas casas,

Os tijolos das suas calçadas onde tantos

Meninos brincaram e correram,

Cantando e sorrindo para o mar,

Ainda afloram aos olhos supersticiosos

Dos pescadores, pelas noites de lua.

A Ilha de Manoel Gonçalves morreu

Para que a cidade de Macau nascesse.

Izan Lucena Lucena
Enviado por Izan Lucena Lucena em 29/06/2012
Código do texto: T3750824
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