Terreno santo
Encontramo-nos em terreno santo
Como santo é o sentimento que me move
Seus olhos pintados e borrados
Esboçavam o desespero de cor e estética
A lágrima encroada não sai
A palavra boa fica no titubeio
Entrego-lhe as coisas, o dinheiro
E a distância, pois estou gripada
E não quero lhe contaminar
Não quero contaminar-lhe com angústia,
Tristeza e solidão.
Mas todos nós estamos sozinhos no mundo
Todos nós diante da vida e da morte
Nos equilibramos
no estreito caminho do momento
Da efemeridade da passagem.
Não sei se meu tempo é hoje.
Talvez tudo aqui seja atemporal
Não sei se aqui é meu lugar
Talvez toda minha localização
seja apenas sideral
Não sei se ainda tenho memória,
Reflexos ou saudades
Pois minha vida interior é bem mais
Do que essa linha do horizonte
É bem menos contável que as nuvens
passadiças e vagas
Hoje é bem provável que chova
Hoje é bem possível que chore
Ou apenas ironize a dor com
alguma piada ou chiste
Só por hoje usei o método
Homeopático de sofrer
Bati a cota, e nos despedimos
Pronto, singelamente.
Enigmaticamente
Tive vontade de desencontrar
De perder novamente.
De rezar para nada
De confessar aos umbrais
Os desejos indizíveis
E recolher a última flor da primavera
Sentir o último vento do inverno
Recebe aos pés, a última folha de outono
Tudo faria para me curar
desse verão infectocontagioso.
Desse fastio de terreno santo e
de vida mortal.