DEVANEIOS (Poema para Basilissa N. 1.640)
(Sócrates Di Lima)
Passa o tempo como lâmina afiada,
Que rasga, corta, sangra e castra,
Como a incisão de uma navalhada,
Faz escorrer na alma o sangue que se alastra.
E lacrimeja o coração na volúpia mórbida,
Da cantiga que se ouve além canteiros,
Leva nas asas de uma palavra sórdida,
A imagem póstuma dos dias trigueiros.
Ah! Que malfadada sorte absolve a liberdade,
Fa-la viajar no tempo na rota do Sol,
Aonde a luz cega os olhos da saudade,
E deixa rastros de sombras no viul arrebol.
Cântico de pássaros no hino da despedida,
Que torce e retorce a sensibilidade do amor,
Traz ao coração a intrépida fadiga,
Que a saudade deixa no olhar de uma flor.
Então cerro as pálpebras do clarão celeste,
E deixo levitar o meu pensamento,
A torpe saudade minha alma veste,
E reveste de tédio cada momento.
Casso o momento de insanidez perene,
Abro os portais da minha absorvição,
Mesmo que mãos aflitas me acene,
E deixo o destino abrir o meu coração.
E se eu voltar desta viagem calvária,
Retorno a via sacra dos meus pensamentos,
E abraço o amanhecer na volúpia imaginária,
De ter a saudade aos pés como escrava dos meus sentimentos.
Há que os devaneios me divagam,
Numa manhã doída de um dia vago,
No anseio torpe das minhas lembranças que vagam,
E que ora me tomam, me devoram e delas me embriago.
E se eu divago em devaneios sem fim,
É porque minha amada voou do meu jardim,
E mesmo que isto por ora não tem fim,
Basilissa ainda está queimando dentro de mim.