Passou, passou... e eu não vi.
Um dia fui menino e apesar da vida miserável devo algum dia ter sorrido de alegria.
Mas, passou...
Passou, passou tanto que eu não vi.
Eu não vi meus sonhos nascerem, nem morrerem.
Não vi quando as lágrimas cessaram, ou será que não cessaram?
É, eu não vi o tempo passar.
Não vi a minha infância terminar, talvez porque ela nunca tenha começado.
Eu não vi a adolescência chegar nem partir.
Eu não enchi a cara, não briguei por espaço.
Não quis jamais ser igual nem diferente de nenhum de meus familiares.
Não me rebelei contra nada.
Não experimentei nenhuma orgia.
E não mergulhei de cabeça em nenhum sonho.
Eu só peguei o que me surgia raramente como oportunidade.
Nunca vivi de verdade a felicidade de estar vivo.
Não me lembro de jamais em algum momento ter sido feliz.
Mas, mesmo assim sido saudade, como se feliz um dia tivesse sido.
É, eu não vi o tempo passar.
Não, eu não vi minha infância começar, nem terminar.
Mas, apesar de todo os dissabores, ainda há esperança, pois que mesmo sendo um adulto ainda carrego dentro de mim algo de uma criança.
E essa criança olha e enxerga o mundo.
E melhor ainda, essa criança não quer mais ver o tempo passar sem nem ao menos ter um momento de alegria sequer.
A criança quer viver.
E eu como bom menino que sou e sempre fui, vou seguindo essa criança por onde ela me levar.
Pois, que eu só quero ser feliz, antes que passe o tempo, antes que passe a vida.