A CASA
nos dias da eterna alegria
das janelas coloridas e das luzes acesas
risos infantis ecoavam pelos cômodos
os beijos roubados na sacada
e os suspiros de amor recendendo a jasmim
eram fragmentos de vida
escondidos pelos cantos
ou passeando pelo jardim
o perfume dos doces e da sidra
espalhava-se pelo quintal
assanhando passarinhos e crianças
comemoravam-se chegadas
choravam-se partidas
partilhavam-se sonhos
cultuavam-se segredos
as portas eram sempre abertas
e o amor morava ali
a casa como um cofre
guarda em si enorme tesouro
tudo o que mais amavas
(e nem sabias que era tanto)
ali repousa sob a poeira do tempo
se não mais habitas a casa
que então o cinza não faça em ti morada
e porque acreditaste que a alegria era eterna
e porque a memória nos beija a face
não assopres o pó nem abras as janelas
deixa as folhas cobrirem o jardim
deixa intactos os sonhos e as promessas
deixa a vida nas fotografias
e nos bilhetes de amor amarelados
lava nas lágrimas tua saudade
e colhe na flor do passado
o perfume e o mel dos teus caminhos de futuro