Escuto o cantar do galo

abrir as portas do dia.

À revelia amanhece

em mim, a antiga alegria.

Um vento bom sopra leve,

mas uma rosa se despe

e a passarada espia.

Meu coração abre os olhos.

Lacrimeja a minha infância,

lembrança de pura luz:

o meu tempo de criança.

Aspiro o ar da saudade,

toda a antiga liberdade

que a velhice não alcança.

O que não tenho ainda aflora

em mim,como antigamente.

A mãe, café e fogão,

o pai, a voz, o violão,

a lua das noites quentes.

O sonho, o verso e a canção

num jogo de amor e mente.

Hoje, oxida a alma

no corpo já velho e só.

O cansaço vence a calma,

a nódoa do esquecimento

transformando o ouro em pó.

Um fio de pensamento

ata as migalhas do tempo

na teia do mesmo nó.

Marilia Abduani

Marilia Abduani
Enviado por Marilia Abduani em 31/10/2010
Código do texto: T2588148