Memórias sensitivas

Diz-se que, criança não gosta de tomar banho

pra não apagar a “sujeira” que conseguiu

com suas peripécias e brincadeiras.

Diz-se que, cachorro se esfrega na carniça

para aprazer seu olfato quando estiver longe dela

e por incrível que pareça urubu não encontra suas refeições

pelo cheiro e sim pela visão.

Comendo a torta de cereja, penso:

quisera não me despregar deste suor

quisera manter este cheiro impregnado em meu corpo

e esta cabeleira desgrenhada,

mantendo os sentidos de uma memória corpórea.

Quantas centenas de sentidos insondáveis e sem nome...

Face, mãos, lábios, nariz, a percorrerem tantos

caminhos do teu corpo, vagarosamente, ternamente.

Quisera possuir toda ternura do mundo

para melhor sentir-te.

Não te preocupes seu moço, o gostar te liberta, não o contrário.

O gostar tem por princípio a liberdade do outro de gostar ou não.

Ninguém é obrigado a gostar de ninguém,

e quando se gosta de fato, se entende esta primícia.

Gosto de ti cavalheiro! Embora reconheça

que o sentimento tende a ralear, desfalecer,

até perder-se por completo em doces recordações.

Porque o gostar amoroso busca a simplicidade de uma relação amistosa.

O amigo só é amigo porque o outro também o é.

Nunca se é amigo sozinho. E por falar em sentir...

Por um tempo pode ser até que exista o platonismo,

mas para quem prefere a alegria a dor, a amor a indiferença,

a reciprocidade se faz conveniente.

Quisera apenas acompanhar-te nos nasceres do sol.

Somente.

Lígia Martins
Enviado por Lígia Martins em 28/10/2010
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