Memórias sensitivas
Diz-se que, criança não gosta de tomar banho
pra não apagar a “sujeira” que conseguiu
com suas peripécias e brincadeiras.
Diz-se que, cachorro se esfrega na carniça
para aprazer seu olfato quando estiver longe dela
e por incrível que pareça urubu não encontra suas refeições
pelo cheiro e sim pela visão.
Comendo a torta de cereja, penso:
quisera não me despregar deste suor
quisera manter este cheiro impregnado em meu corpo
e esta cabeleira desgrenhada,
mantendo os sentidos de uma memória corpórea.
Quantas centenas de sentidos insondáveis e sem nome...
Face, mãos, lábios, nariz, a percorrerem tantos
caminhos do teu corpo, vagarosamente, ternamente.
Quisera possuir toda ternura do mundo
para melhor sentir-te.
Não te preocupes seu moço, o gostar te liberta, não o contrário.
O gostar tem por princípio a liberdade do outro de gostar ou não.
Ninguém é obrigado a gostar de ninguém,
e quando se gosta de fato, se entende esta primícia.
Gosto de ti cavalheiro! Embora reconheça
que o sentimento tende a ralear, desfalecer,
até perder-se por completo em doces recordações.
Porque o gostar amoroso busca a simplicidade de uma relação amistosa.
O amigo só é amigo porque o outro também o é.
Nunca se é amigo sozinho. E por falar em sentir...
Por um tempo pode ser até que exista o platonismo,
mas para quem prefere a alegria a dor, a amor a indiferença,
a reciprocidade se faz conveniente.
Quisera apenas acompanhar-te nos nasceres do sol.
Somente.