MINHA AVÓ
Minha avó…
De trajes escuros, da cor do carvão.
Minha avó
De panos escuros,
Viveste toda uma vida de solidão!
Sempre de luto,
Toda tu foste Tristeza
Sempre de luto,
Por fora e… também por dentro
Disso tive sempre a certeza!
Tuas mãos de pele encarquilhada,
Tuas mãos calosas da enxada
Tuas mãos enegrecidas…
Pelo sol, pelos anos e pela terra!
Tuas mãos que desfiaram tantas vezes
As contas gastas
De um rosário tão velhinho…
Não fazias mais que orar…por mim
E por todos que cruzaram teu caminho!
Teus olhos cedo perderam o brilho
E da tua mocidade…
Apenas te restou um par de brincos,
Duas argolas de ouro
Tão velhas e amolgadas…
E também a saudade…!
De um manto de luz e de magia,
Nos nossos longos serões,
O luar teu rosto cobria…
E eu via o mundo em teus olhos
Tão tristes e sábios…
Abrias teus lábios para histórias
Tão velhinhas me contares,
Histórias da tua vida, avózinha
Então eu via que tu, tudo sabias e que,
O que eu sabia de ter lido nos livros,
Tu tinhas gravado na tua carne,
Já de rugas tão coberta…!
Tua voz sempre foi tão cheia de certezas…
E teu olhar sempre foi tão sábio!
Quando partiste senti o vazio…
A tristeza de uma infinita saudade…
Porque levou Deus tão cedo da minha vida
O símbolo do Amor e da Bondade?
De ti me ficou o maior tesouro deste mundo:
Um velho lindo par de brincos...
Duas argolas de ouro amolgadas
Que eu guardo e uso com um amor profundo…!
(Ana Flor do Lácio, abril 1990)