Quintais

Saudades de certos quintais . . .
Especialmente daquele que continha árvores:
um abacateiro, uma pitangueira e
uma figueira morta, ressecada.
Foi ela o meu primeiro cavalo
de todos que nunca tive.
E sim, como não, também haviam cabanas no bambuzal.
Cada um tinha a sua e, dessa sorte, tornamo-nos
o elo perdido: “Homo Bambu”.

Quintal que em Maio amanhecia branco de geadas.
Eram inevitáveis se o anterior pôr-do-sol fosse alaranjado.
Coisas da Mantiqueira.

Quintal onde em certo tempo plantou-se milho.
Noutro, batatas. Os primeiros, debulhados, foram trocados por pães.
As segundas, fritas, deram-me a primeira (ou única?) sensação de abundância.

Saudade do quintal que continha um certo banco,
lastreado por jovens rebeldes que amavam Níveas
e iam aos cinemas nas tardes de domingos.
Jovens que eram jovens no tempo da Ditadura e
por serem jovens: se hay un gobierno yo soy contra.

Menos um. Direitista danado. Viveu pouco tempo.

Os outros tiveram filhos, dividas, dúvidas
falências, padarias, bons empregos, lojas e sonhos.
Também tiveram labirintites, artrites, tosses,
amarguras, alegrias baratas, cânceres e espinhela caída.
E assim vamo-nos acabando.

Mas a memória daquele quintal insiste em sobreviver.