ATROZ SOFRIMENTO
Sentado num banco qualquer
de uma antiga praça gramada.
Um velho indigente,
pensando na vida...
bebendo cachaça.
Embaixo do banco,
oculto no escuro da praça.
O companheiro fiel...
um zeloso cãozinho vira lata.
Sentinela atenta aos perigos do mundo.
De olho grudado no velho barbudo...
amigo de vida parceiro de estrada.
Rugas no rosto,
unhas compridas e roupa rasgada.
Migalha de pão grudada na barba.
Cigarro na boca...
soltando fumaça.
Olhos d´água vagando distante,
pelo céu de estrela e lua de prata.
Pelos mistérios da vida...
e infinito da alma.
Abismo profundo...
dor que não passa!
Sofrimento constante, ferida em brasa.
Lembrança antiga da musa amada.
Do aroma de flor, dos olhos faceiros...
Sorriso de fada e pele dourada.
Outras lembranças,
do velho indigente, invadem a alma.
Do tempo de moço galante, do carro do ano, do terno e gravata.
Dos corpos amantes rolando na relva da praça gramada.
Dos lábios de néctar, da boca de deusa e olhos de gata.
Das juras de amor sob o céu de estrela e lua de prata.
De repente...
no silêncio da noite um suspiro profundo.
Doloroso grunhido do anjo canino embaixo do banco.
Como quem entendendo do velho amigo o atroz sofrimento.
Pelo triste lembrar do voraz abandono,
daquela infeliz alma cativa!...
escrava do amor!
escrava da vida,
escrava do mundo.