BARCO SEM MAR
Ansioso barco, velhas chaminés,
que praia seca todo o mar secou?
Na esteira de quais ondas e marés
teu navegar de sonho naufragou?
Largado barco que falaste às águas,
guardas no casco a forma, o gosto, a voz
de ondas, fosforescências, peixes, algas,
e no mastro o voejar de um albatrós.
Cracas vivas em ti se multiplicam
ávidas de sal, de oceano e léu.
Espumas esbranquiçadas dançam
num bordo sem memória, barco ilhéu!
Ó, barco ilhéu, na areia encravado,
ó, leme entorpecido, já sem mão,
chaminé do tempo esfumaçado,
gume da quilha, proa sem o vão.
O débil curvo nome do infinito
lavado pela espuma e solto no ar.
Que água apagou o nome escrito,
barco sem nome e só, barco sem mar?
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