Volutas ao vento

Saudades do que não mais temos; saudades daquilo que o tempo, este frio vilão, malvado e insensível - sorrateiramente usurpou.

Nem bem sei do que me sinto saudoso, se nem mesmo a sombra de ti, como último e sonhado legado – sequer me restou.

Sou como bebê sentindo saudades de leite, daquele leite de mãe - leite que nunca mamou.

Saudade perversa que te transforma num vulto, fantasma que o vento em brisa - inopinadamente levou.

Fazer poesia sofrida é mister, assaz deveras penoso, melhor lembrar de outros tempos - de tempos bem mais ditosos,

Tempos serenos, risonhos, opostos destes de agora, tempo em que o sonho imperava, não havia bala nem susto, que mandasse a alegria embora.

Ai! Como é bom ser criança, suspiro aqui entredentes; não existe quase cobrança quando ainda adolescentes. Adultos, a coisa complica – tem de ser tudo na hora.

Não há rota de fuga segura, nada que a dor nos mitigue, que cure nossas agruras; não é de bom tom ver um homem sisudo, acabrunhado; desanimado, choroso.

Engulo as lágrimas a custo, afogando em mim este banzo, esta saudade teimosa, a se chegar com malícia; insistente, insidiosa - à qual boas vindas não dou.

Escancaro as janelas de meu coração para outros ares entrar, e deixo florescer, com o adubo desta paixão, que ora acaba de morrer,

Um renovado amor por mim mesmo, imune às lufadas deste vento, mensageiro de desalento; incômodo, ingrato, briguento, que leva em suas negras asas, volutas de um outro Ser.

Visto meu gibão de menino, e monto de imediato, suprimindo este angustiante hiato, o cavalo de meu destino; munido de insana coragem, arranco de minha carne o último espinho que ficou...

... entregar a rapadura, dito de minha terra – certamente não vou.

No Universo tudo é renovação. Munido deste axioma, extraio forças da mina inesgotável existente no interior de meu Ser para enfatizar o dito popular dos sertões: “não entregue a rapadura”, que significa lutar sempre, mesmo quando tudo lhe parece adverso.

Vale do Paraíba, tarde da segunda Quarta-Feira, Abril de 2009.

João Bosco (Aprendiz de poeta)