A lousa e a cruz
Lá no alto da ribeira,
suspensa, uma cruz caiada
faz sombra à lousa gessada
onde repousa meu pai;
é onde velha mangueira
carrega fruta rosada,
é lá que minh'alma inteira
chorando por noites vai.
Lá se encontram cotovias,
as rolas formam casais,
faço lá verter poesia
e espero todos os dias
que os dias me esperem mais;
quero ver flor na videira
e sonhar entre os florais,
mas lá a minh'alma inteira
chorando por noites vai.
Bebo as águas da ribeira
jaspeadas pelo lamento,
e sobre a lousa, na poeira,
abro a frase de um poema
que guardo por muito tempo:
“basta cobrir-me, não tema;”
desço a mansa da ribeira
numa prece pro meu pai,
e é lá que minh'alma inteira
chorando por noites vai.