AS FLORES DA SAUDADE
AS FLORES DA SAUDADE
Em miúdos toque,
em suave aproximação,
pequeninas gotas repousam silenciosas
em minha janela.
Tímidas, fazem-me convites
e provocam despertares inconscientes.
Chove bonito.
Chove em paz.
Lá fora, um brilho de verniz
emana da paisagem.
A catedral, o rio,
os casarões adormecidos,
os morros floridos por árvores roxas,
tudo resplandece.
As flores da Quaresma
e até mesmo os telhados velhos
cintilam úmidos
revestidos de súbita mocidade.
Os sentimentos, as cores, a natureza, as flores,
às vezes, se combinam.
Há flores que não comportam o peso das gotas,
e, vencidas,
trêmulas,
deixam escorrer por suas pontas
suas muitas águas acumuladas.
As flores têm cor de saudade,
a chuva tem luz de novas idades,
e os meus olhos, comovidos,
se desmancham diante dessa fragilidade.
Não sei se chove a chuva
ou se chove eu mesma.
Há sentimentos que chegam também de mansinho.
Chegam bonitos.
Chegam em paz.
Consola-me saber
que, assim como as flores
despencam chovidas da Quaresma ,
a Saudade que hoje choramos
também se vai,
aos poucos, desmanchando-se pelos dias.
E os amores, os remorsos, o abandono
sutilmente se despreendem das dores
e cedem passagem
a outras primaveras.
Pela manhã,
o sino da igreja
anuncia um novo dia
e as pessoas
caminham à margem do rio,
pisoteando, sem perceber, as pétalas roxas
esquecidas pelas ruas de suas vidas.
A Paulo
In Memorium
Eterno anjo sobre a minha poesia