Saudades de ti, meu irmão
Sabe, mano? Hoje eu sinto tua falta,
já não consigo lembrar teu olhar
sem que lágrimas aflorem
e comece a chorar.
Lembrar tanto tempo perdido
em discussões inúteis e brigas passageiras,
Lembra teu maior sonho? Tantas besteiras!
Teu sonho infantil de ser igual a mim?
Fazer o que eu fazia,
vestir como eu vestia,
quase ser eu, enfim.
Me achavas livre e feliz,
mas não era assim, meu irmão,
hoje a vida me diz.
Já naquele tempo eu não era livre
e me via longe de ser feliz.
Pois que tudo que fiz
só ensinou-me a sofrer melhor,
ver a miséria de perto
e a fome dentro da gente.
E aquele vício latente
era ainda pior.
Poxa, há tanto tempo não te vejo!
Não irias me reconhecer,
aquele cara livre e feliz
que tu imaginavas no passado,
hoje é um homem cansado.
Cabisbaixo e triste, não sou mais o mesmo,
foram tantos anos à esmo.
E é me vendo no espelho que espero
que não tenhas seguido o caminho
que nos deixa sozinho
naquele sonho infantil.
Sem lugar para criança,
sem lugar para lembrança,
onde a gente envelhece depressa
e quando mais nada interessa
já não se pode voltar.
Só esperar um futuro melhor
para um passado perdido
mas o futuro demora agora (e aí é pior)
e o passado falido
passa a ser teu presente
e é aí que se sente
quanto tempo perdeu.
Revirando rabiscos, encontrei essa mensagem que escrevi a meu irmão e nunca entreguei. Data de 1984, quando finalmente abandonei um vício que me vencia. Fazia seis anos que não o via. Hoje perdi a conta dos anos que não o vejo.
Lendo, achei que era hora de reescrevê-lo como forma de me desculpar.