apenas por uma tarde

essa tarde as moitas

me espreitavam

seguiam meus devaneios infantis,

brincavam com a brisa e

sofriam com chuva

essa tarde,

a porta subitamente bateu

e, estrondo despertou o

dragão tatuado numa porcelana

e no fogo que expelia

queimavam minhas quimeras juvenis

lembrava dos vestidos

de marujo, das manginhas apertadas

em volta de braços finos,

como pequenos gravetos

prestes a quebrar

minha fragilidade externa

era ofensiva e paradoxal

perto da linha reta e robusta

de meu olhar

fotografias deixavam-me ainda

mais franzina e rija.

um flash, e lá está

o momento capturado,

ficava empapelado,

amarelado e emoldurado

em algum lugar esquecido da casa

essa tarde, os sinos das igrejas

tocavam rezando em silêncio

pelos mortos

e ecoando pelos vivos.

um pássaro brejeiro pousa na janela

e de soslaio se precipita em olhar

o interior

a liberdade das moitas

a intangibilidade dos ventos

o encantamento da tarde

e, tudo que eu tinha

era um clique,

um momento eternizado numa

retina digital.

Mensagens instantâneas,

afetos surreais

geram amigos, inimigos

e conhecidos.

Só o homem não se reconhece nas sombras,

Só o homem não se antevê no espelho...

Prefere amargar a esperança

em ser tudo aquilo

que gostaria de ser

nem que fosse apenas por uma tarde.

GiseleLeite
Enviado por GiseleLeite em 28/05/2008
Reeditado em 25/06/2008
Código do texto: T1008450
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