Eu nunca mais chorei.
Quando eu era criança
E desaparecia
Subia lá no alto, só de brincadeira...e ria
Ria, de incauto que era
E pulava de lá, por prazer
Só pra ouvir o ar, que zunia
Uma vez eu encontrei
Um pássaro triste, que tinha desistido de voar
Daqueles, que quando dói, nunca se lastima
Não chora, não pede ajuda
Se recolhe no próprio lamento
Finge morto, finge mudo
Se tinge de esquecimento
Enfim, nada escolhe na vida
E mesmo assim
Teve a escolha de sofrer calado
Eu conto essa passagem
Num poema bobo e sem rima
Porque desde pequeno
Eu também não podia chorar, nunca tive coragem
E nunca me ensinaram o jeito certo de falar com Deus
Pra dizer-me arrependido e nem pedir perdão
Nunca aprendi pedir nada pra Deus
Mas o certo era que o pobre pássaro
Pode ser que ele só fosse igual a esse que eu sou agora
Daqueles que quando chora...é só por dentro
Num lamento mudo
O pássaro, assustado, caiu lá de cima
E nem me deve ter ouvido, me perdoa
Quedou-se no chão
Num tombo quase tão breve quanto uma vida
E ele também deve ter sentido
O ruido leve que zuni no ouvido
Que só ouve quem cai
Mas naquele momento
Como quase tudo que acontece à toa
Não deu tempo pra nada
O pássaro mudo morreu, sem chorar, sem tempo
Pode ser que eu, depois daquele dia, o tenha tido
Ajuntei todas as lágrimas
Que tinha pra chorar durante a vida
Quando o pássaro subiu pro Céu
Eu pedi pra ele levar
Se Deus as recebeu, não sei
Mas, depois daquele dia, nunca mais chorei.
Edson Ricardo Paiva.