Pitangas no ar.

Vou devorando a minha vida

É tarde de outono e eu queria tanto andar na chuva

Quando eu vejo, o sol tá no horizonte

O dia tá desfeito em mar de fantasia

Às vezes quase eu durmo

De tanto querer que o sono venha

Há tantas vidas, difícil é ter outra a ter tantos quereres

No início é ter que acostumar as vistas

É como estar em um pomar

E ver que o fruto e as folhas são da mesma cor

Vou fazendo de conta que conto pitangas no ar

Outono é tarde, estou noutra estação

Outro trem vai vir, há de passar

A noite chega em mim

A noite chega e se lastima assim

A dizer que o trem que vai passar não leva ao fim da linha

Eu digo à noite que a vida é uma lista

Eu peço à vida que seja da noite esse olhar pessimista

Apago da lista esse triste desejo

De chegar nessa manhã que tem jeito de tarde

Eu só escolho querer, numa vontade que não é minha

Tarde que andava na linha, rumo à próxima estação

Eu queria era andar, andar sem rumo e nem direção

Andar na chuva

Colhendo as pitangas que flutuavam

Pitangas amarelas, iguais àquelas

Que existiram nos fundos de algum quintal da minha infância

Onde eu ia devorando a vida

Um lugar, uma estação

Um trem que passava e tinha a companhia sempre lá

De alguém que te acompanha e leva pro infinito

E apanha frutos no ar, igual ao que a gente fazia

Quando o dia era desfeito em mar de fantasia

A gente sabe e cansa de saber que esse infinito acaba

E mesmo assim desata a rir

Num riso que não tem fim.

Nem precisa acabar.

Edson Ricardo Paiva.