Percurso da bailarina

Olha ali,

Aquela moça!

Com cara de menina,

Corpo de vadia,

Usando estas roupas de verão, só pode.

“Tá” querendo dar um bote.

Vou acompanhar o seu caminho.

Eu sei que ela quer.

Se não quisesse,

Estaria trancada em casa bem longe,

Esperando o seu Homem num chalé.

Aproximo devagar.

Ela sente a minha presença.

Presença de homem-macho

Que consegue o que quer.

Para fingir ser difícil, ela aperta o passo.

Isso, moça.

Deixa a aventura mais perigosa.

Mas sou mais forte.

É grosso meu porte.

Aposto que vai ficar fogosa.

Então consigo puxar o seu braço.

Meu coração aperta.

Ao virar o seu rosto de menina,

Com corpo de vadia,

Deparei com seus olhos.

Eles falavam “Socorro”.

E lembrei do meu tempo do Morro,

Em que minha mãe, com o mesmo olhar,

Era espancada pelo meu padrasto.

E abusada por todos os lados.

Seus olhos enchiam d’água.

E ela gritava para dentro de si.

De forma que eu só lia em seus lábios:

“Filho meu,

Você nasceu para ser precioso.

Entenda: mulher é para ser amada,

Respeitada.

Por ser mulher, por ser humana.

Por ser o ventre que trará vidas.

E com o afeto que ela proporcionará,

Serão as mais belas pessoas.

Eu te fiz assim, para ser belo.

Então, meu filho,

Quando crescer e tiver rosto de homem,

Corpo forte de guerreiro,

Pense em sua alma,

Que é o verdadeiro crescimento,

De um ser humano perfeito.”

...

Então, olha aqui,

Esta moça

Com cara de menina,

Com corpo de bailarina.

Esteja livre para ser o que quiser,

Pois não sou o seu dono

E ninguém o é.

Você é dona de si.

Ó, menina bailarina.

Agora continue o seu caminho.

E se pelo percurso cruzar com um homem

Com cara de macho e corpo forte,

Mas sem alma.

Fuja,

Grite,

Defenda-se.

E não deixe nenhum rapaz, ou até algumas moças, dizer o seu valor.

Continue a dançar belamente pela sua vida.

Como mulher que deve ser respeitada.

Por ser apenas você.

Independente do seu credo.

Independente do seu viver.