A VELHICE
Todos os dias eu sonho com a minha infância, adolescência e maturidade. Somente dessa forma eu me dou conta da importância da minha velhice. Que me deu a certeza de que a minha velhice é muito mais bonita do que o Alzheimer, do que o jogo de ter a paciência que a vida me contemplou ao longo desses tantos anos felizes.
De alguma forma, alguém pode até dizer: “como é feia a velhice”. E num retrucar de palavras eu afirmo: “como é linda a velhice.”
A velhice me transporta aos meus primeiros bailes, regados a ponche, ao primeiro beijo tímido, e àquela primeira pergunta: “foi legal pra você?” E muito depois daquele ensaio de namoro, vinha aquela saudade que invadia sonos, insônias eternas, pedindo para que o dia amanhecesse rapidamente, e eu pudesse ter uma nova oportunidade de disputar o meu segundo beijo, sem a concorrência daqueles que jamais puderam compreender a intensidade da minha velhice.
Todos os dias eu tenho presságios da minha juventude que soube da maneira mais serena, acalentar o meu corpo quando dos meus cansaços de criança, e hoje nos meus cansaços de velhice. Essa mesma velhice que me leva aos passeios da lembrança do que eu fui um dia. Essa mesma bela velhice, que grita aos tantos ventos da minha audição: eu não morri. E quantas velhices puderam se tornar belas, feito a minha! O meu contentamento com a vida, fechará um ciclo de realizações que somente é permitido a um coração pleno de paz. Nenhum dia dos que eu vivi, será igual ao outro, tampouco parecido.
FERNANDO VARELA