No final das contas

Se a morte hoje

me alcançar

antes do pôr-do-sol,

e-mails não respondidos

problemas não resolvidos

papéis não assinados

telefonemas não dados

outros responderão resolverão assinarão darão

por mim.

Ou não.

E se não,

pouca diferença fará

(ou nenhuma)

no final das contas.

Sobre os parcos despojos

de uma vida sem ambição,

outros se deitarão,

depois de queimarem

livros

fotos

cartas

diários

– resíduos/vestígios

do abismo

profundo

que há anos

eu levo

dentro de mim.

Se a morte hoje

me alcançar,

no entanto,

o que de mim ficará

de mais importante (e que para mim é o que conta,

no final das contas)

escapa

totalmente

à contabilidade estreita

de um mero contador de coisas:

ficarão as vezes

que abracei meus filhos e disse “Papai ama vocês”,

que fui paciente e compreensivo com quem me atacava,

que ajudei sem esperar nada em troca,

que me calei para não ofender ou magoar,

que dei atenção e importância ao problema do outro,

que estendi minha mão para socorrer, amparar...

Se a morte hoje

me alcançar,

sei que poderia ter ficado muito mais de mim

se eu tivesse feito mais...

se eu tivesse sido mais...

como filho pai irmão esposo amigo.

Mas este sou eu

agora

de braços

abertos,

nu,

com o vinho

pela

metade.

E é isto que ficará,

se a morte hoje me pegar,

no final das contas.

Flávio Marcus da Silva
Enviado por Flávio Marcus da Silva em 14/01/2013
Código do texto: T4083449
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